terça-feira, 26 de maio de 2009

A linguagem, as coisas e seus nomes - adaptação do texto de Eduardo Galeano

Na era vitoriana era proibido fazer menção às calças na presença de uma senhorita. Hoje em dia, não fica bem dizer certas coisas perante a opinião pública. Assim, para sermos politicamente corretos, reinventamos nomes para definir velhas práticas e conceitos. Alguns exemplos:

O capitalismo, há algum tempo, exibe o nome artístico de economia de mercado. O imperialismo se chama globalização. As vítimas do imperialismo se chamam países em via de desenvolvimento. O oportunismo político ou econômico se chama pragmatismo. A traição se chama realismo. Os pobres se chamam carentes ou pessoas de escassos recursos. Quando tudo isso fracassa e o mundo entra em crise, é preciso providenciar uma reengenharia...

A exclusão de crianças pobres do sistema educativo é conhecida pelo nome de deserção escolar; O direito do patrão de despedir sem indenização nem explicação se chama flexibilização das leis trabalhistas. A mudança das regras do jogo, aos 47 do segundo tempo, chama-se Fator Previdenciário.

A linguagem oficial coloca os direitos das mulheres entre os direitos das minorias. Mas a maioria da população mundial é de mulheres...

Se uma ditadura oprime uma pequena ilha no Caribe, é ditadura. Se governa com mão de ferro mais de um bilhão de pessoas, é parceiro comercial.

Torturas são chamadas de constrangimentos ilegais ou pressões físicas e psicológicas.

Quando os ladrões são de boa família, não são ladrões, são cleptomaníacos. O saque dos fundos públicos por políticos corruptos atende pelo nome de enriquecimento ilícito.

Chamam-se acidentes os crimes cometidos pelos motoristas de automóveis. Em vez de cego, se diz deficiente visual. Um negro é um afro descendente.

Mal súbito significa infarto. A Morte pode ser chamada de desaparecimento. Tampouco são mortos os seres humanos aniquilados nas operações militares: os mortos em batalha são baixas e os civis, que nada têm a ver com o peixe e sempre pagam o pato, são qualificados de danos colaterais.

Quando os franceses fizeram testes nucleares, explodindo bombas atômicas no Pacífico Sul, bem longe da França, o embaixador francês na Nova Zelândia declarou: "Não gosto da palavra bomba. Não são bombas. São artefatos que explodem".

Dignidade era o nome de um dos campos de concentração na época da ditadura chilena e Liberdade o maior presídio da ditadura uruguaia.

Chama-se Paz e Justiça o grupo militar que, em 1997, matou pelas costas quarenta e cinco camponeses, quase todos mulheres e crianças, que rezavam numa igreja, em Chiapas, no México.

Em Brasília, há um grupo de parlamentares denominado Conselho de Ética...

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